Por Comunicação do Movimento Baía Viva

A WATERLAT-GOBACIT, rede internacional, transdisciplinar de ensino, pesquisa e intervenção prática no campo da política e da gestão da água e dos serviços baseados no uso da água, lançou no final de julho desse ano, uma carta sobre a 10º aniversário da Resolução 64/292 da Assembleia Geral das Nações Unidas que reconhece o direito de todo ser humano ao acesso à água potável.

A Declaração Pública da Rede WATERLAT-GOBACIT no 10º aniversário da Resolução 64/292 da Assembléia Geral das Nações Unidas (ONU) reconhecendo “que o direito à água potável e o saneamento é um direito humano essencial para o pleno gozo da vida e de todos os direitos humanos”. A declaração conta o histórico das lutas sociais para garantir o acesso ao saneamento básico e a água potável frente ao desregulamentação e privatização dos serviços essenciais de água e esgotamento sanitário. Esse cenário está se agravando desde o início do século 21, como indica o texto da carta: “Essas políticas, se expandiram por toda a região e internacionalmente e foram respondidas com mobilizações massivas de protesto e rejeição, principalmente devido aos impactos negativos da privatização, que contribuiu para o aprofundamento dos níveis de desigualdade e injustiça no acesso a esses serviços essenciais levando a maioria dos países que os adotaram a profundas crises de caráter político-social e econômico-financeiro cujos impactos  continuam afetando a capacidade dos Estados de proteger e garantir os direitos de seus cidadãos.”

Sobre a Rede WATERLAT-GOBACIT
A origem da Rede se remete ao início de 1990, quando um grupo de acadêmicos e estudantes latino-americanos da Faculdade Latino-Americana de Ciências Sociais (FLACSO) sede México, e do Instituto de Investigação Gino Germani, da Universidade de Buenos Aires, Argentina. WATERLAT-GOBACIT é uma rede inter- e transdisciplinar de ensino, pesquisa e intervenção prática no campo da política e da gestão da água e dos serviços baseados no uso da água. A Rede tem forte presencia em América Latina e Caribe, embora seu enfoque é de caráter global. A Rede reúne as dimensões cultural, ecológica, econômico-financeira, de saúde, de gestão e operacional, institucional e de políticas públicas, e política das questões relacionadas a água. O Movimento Baía Viva é um das organizações parceiras dessa rede que conta com membros espalhados pela África, Ásia, Europa, e América Latina e Caribe.

A seguir a íntegra da carta:

Declaração Pública da Rede WATERLAT-GOBACIT no 10º aniversário da Resolução 64/292 da Assembleia Geral das Nações Unidas reconhecendo “que o direito à água potável e o saneamento é um direito humano essencial para o pleno gozo da vida e de todos os direitos humanos”

A Resolução 64/292 aprovada pela Assembleia Geral das Nações Unidas (AGNU), em 28 de julho 2010, foi precedida de inúmeras iniciativas que há décadas insistiam na necessidade do “reconhecimento formal do Direito Humano à Água e ao Saneamento (DHAS)”. No estágio anterior à aprovação da Resolução, principalmente a partir do início dos anos 2000, essas iniciativas receberam um impulso muito importante das intensas mobilizações globais que foram parte das lutas sociais contra a expansão das políticas neoliberais – desde a década de 1980 – como a desregulamentação e privatização dos serviços essenciais de água e esgotamento sanitário. A implementação dessas políticas foi impulsionada nos países da América Latina e do Caribe, onde o Chile à nível mundial se tornou um caso excepcional devido à natureza radical do modelo de privatização adotado, que incluía a privatização de fontes de água e posteriormente, a maioria das empresas de água e esgotamento sanitário em áreas urbanas. Na década de 90, a Argentina se tornou um território experimental para essas políticas e em apenas seis anos (1993-1999), o governo da época implementou a privatização dos serviços públicos de água e esgotamento sanitário que atendiam a aproximadamente 70% da população do país. Essas políticas, se expandiram por toda a região e internacionalmente e foram respondidas com mobilizações massivas de protesto e rejeição, principalmente devido aos impactos negativos da privatização, que contribuiu para o aprofundamento dos níveis de desigualdade e injustiça no acesso a esses serviços essenciais levando a maioria dos países que os adotaram a profundas crises de caráter político-social e econômico-financeiro cujos impactos continuam afetando a capacidade dos Estados de proteger e garantir os direitos de seus cidadãos, incluindo o DHAS.

Nesse contexto, devemos destacar o papel que cumpriram os movimentos sociais que conseguiram impulsionar os governos de vários países, particularmente na Bolívia e no Uruguai, a liderarem as renovadas iniciativas para o reconhecimento do DHAS nas Nações Unidas. Muitos outros países estiveram em silêncio ou se opuseram à iniciativa por diversas razões. De fato, é importante lembrar que a iniciativa que levou à votação da Resolução 64/292 em julho de 2010 não foi conduzida, pelo menos não formalmente, pelos países mais influentes da ONU – muitos dos quais, historicamente, se opuseram ao reconhecimento do DHAS e se abstiveram de votar ou estiveram ausentes no dia 28 de julho de 2010. Os países que apoiaram formalmente o texto da Resolução final colocada à votação foram os seguintes:

• África: Angola, Benin, Burkina Faso, Burundi, Congo, Eritreia, Guiné, Madagascar, Mali,
Maurício, Nigéria, República Centro-Africana, Seychelles.
• América Latina e Caribe: Antígua e Barbuda, Bolívia, Cuba, Dominica, República Dominicana,
Equador, El Salvador, Haiti, Nicarágua, Paraguai, Santa Lúcia, São Vicente e Granadinas, Uruguai,
Venezuela.
• Ásia: Arábia Saudita, Azerbaijão, Bahrein, Bangladesh, Fiji, Maldivas, Samoa, Sri Lanka,
Timor-Leste, Iêmen.
• Oceania: Ilhas Salomão, Tuvalu, Vanuatu.

Embora a resolução tenha sido aprovada em 28 de julho de 2010 graças aos votos de 122 países, devemos lembrar que 41 países se abstiveram de votar e 29 se ausentaram, ou seja, 36% dos 192 países representados NÃO votaram na aprovação da resolução. Entre os países que se abstiveram, devemos destacar, por sua alta influência na ONU, e no desenvolvimento e implementação de políticas no setor de água e de serviços essenciais de água e esgotamento sanitário a nível internacional – inclusive na promoção de políticas de privatização e mercantilização – os seguintes países: Austrália, Canadá, Estados Unidos, Israel, Japão, Holanda e Reino Unido. Apesar da maioria dos países que não votaram mais tarde terem decidido apoiar formalmente o DHAS, é importante destacar esse padrão de longo prazo de oposição e apoio morno demonstrado por muitos países à iniciativa de reconhecer que o acesso à água potável e ao saneamento é um direito humano.

Conectado a isso, a conquista histórica do reconhecimento do DHAS na ONU em julho 2010 foi marcada por dúvidas sobre o nível de comprometimento efetivo dos Estados nacionais e das instituições internacionais de desenvolvimento e financiamento com as políticas necessárias para efetivar este direito na prática. Nesse sentido, é importante recordar que a própria Resolução 64/292 mencionava como um antecedente a decisão de reconhecer o DHAS: o “compromisso contraído pela comunidade internacional de cumprir plenamente os Objetivos de Desenvolvimento do Milênio (ODM) de reduzir pela metade até 2015 a porcentagem de pessoas que careçam do acesso à água ou não possam custeá-lo [… e] a porcentagem de pessoas que não têm acesso a serviços de saneamento básico”. Como temos feito de forma explícita em declarações prévias, apesar dos discursos triunfalistas da ONU, de muitas instituições e governos em relação à meta de acesso à água dos ODM, os dados demonstram que, apesar dos enormes esforços, e muitos exemplos de sucesso, a nível global esta meta não foi alcançada, assim como tão pouco foi alcançada a meta para o saneamento, enquanto muitas regiões experimentaram severos retrocesso. Sem dúvida, a aprovação dos Objetos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) para 2030 reviveu as expectativas de que o DHAS pudessem ser efetivados, uma vez que os ODS retomaram a ambiciosa meta da universalização do acesso aos serviços essenciais de água e esgotamento sanitário, superando o nível mais limitado dos ODM de “reduzir à metade a porcentagem de pessoas” sem acesso. Infelizmente, eventos mais recentes – agravados pelo impacto da pandemia do COVID-19, que estamos enfrentando neste
momento – voltam a pôr em questão de forma séria o nível de comprometimento dos Estados nacionais e das instituições internacionais de desenvolvimento e financiamento com o cumprimento efetivo tanto dos ODS como do DHAS.

Outra questão importante, que deve ser enfatizada, é que embora em muitos aspectos o reconhecimento do DHAS tenha sido uma conquista histórica que celebramos e defendemos é necessário considerar que seu texto e suas implicações abriram uma série de controvérsias que permanecem sem solução. Devido a extensão desta Declaração, mencionaremos apenas duas dessas controvérsias, que têm grande relevância, considerando os desafios enfrentados para alcançar os ODS no ano 2030:

• A primeira controvérsia exemplifica o rechaço do DHAS por ser considerado uma nova expressão do caráter imperialista, discriminatório, expropriatório etc. que historicamente assumiu a apropriação e exploração dos bens naturais. É interessante que esse tipo de denúncia surgiu entre as comunidades indígenas nos países andinos, como por exemplo na Bolívia, um dos países que desempenhou um papel central na iniciativa que culminou na aprovação da Resolução em julho de 2010. O argumento é que as comunidades originais – que historicamente consideraram água como um bem comum que não poderia ser apropriado – foram expulsas de seus territórios e expropriadas, entre outros bens, do acesso à água, primeiro, durante os processos de colonização europeia e, em seguida, através da criação dos Estados-Nação que aprofundaram os processos de desapropriação e marginalização. Logo, para as comunidades originárias, reconhecer o DHAS seria reconhecer a legitimidade dos processos de colonização e desapropriação. “Por que”, perguntam, “precisamos aceitar que o Estado desapropriador e colonizador nos outorgue o direito à água? Esse direito sempre
tivemos, desde antes de haver um Estado-Nação, que logo nos tirou”. Situações semelhantes são registradas, em diversas regiões do planeta, entre as comunidades originárias e campesinas para as quais a formulação atual do DHAS não leva em consideração suas
necessidades e interesses. Citamos essa controvérsia porque reflete um dos obstáculos centrais enfrentados pelo cumprimento dos ODS, uma vez que os indígenas, afrodescendentes e campesinos estão entre os grupos que continuam marginalizados e criminalizados por suas lutas em defesa da água e de seus territórios, processos que atingiram níveis de extrema violência em várias partes do planeta, mais especialmente na América Latina. Para muitas dessas comunidades o DHAS é outro instrumento de dominação. A controvérsia ainda está aberta.

• A segunda controvérsia tem a ver com o caráter negligente, genérico e permissivo da atual formulação do DHAS. Especificamente, o nível de indefinição do DHAS sobre as opções de políticas públicas, gestão da água e serviços essenciais, permitindo – em nome do DHAS – que políticas como a privatização e a mercantilização de serviços públicos essenciais fossem promovidas, mesmo que essas sejam claramente impedimentos à consecução dos ODS e a efetivação do DHAS. Este é um problema que os setores críticos às políticas neoliberais – setores que incluem movimentos sociais, sindicais, políticos, comunidades mobilizadas, setores da academia, entre outros, denunciam desde o momento da aprovação da Resolução em 2010. Contudo, em vez de abrir-se ao debate democrático, essa controvérsia foi silenciada, ao mesmo tempo em que os Estados nacionais, instituições internacionais de desenvolvimento e financiamento – incluindo setores da ONU, juntamente com atores interessados no controle e gestão privatista da água e dos serviços essenciais especialmente grandes empresas transnacionais que operam no setor – multiplicaram mecanismos políticos, jurídicos, financeiros etc. que permitem o avanço e aprofundamento dessas políticas neoliberais, inclusive em nome do DHAS. Entre outras questões, os setores críticos que
participam nessa controvérsia demandam uma redefinição da própria noção de DHAS incluída na Resolução do ano de 2010. Os atores mobilizados desconfiam do grau de compromisso com os ODS e DHAS dos Estados nacionais, instituições internacionais e empresas transnacionais, visto que, esses atores exercem uma influência significativa na formulação e implementação das políticas públicas no setor desenvolvendo suas próprias propostas de revisão do texto. Um exemplo vindo da aliança entre os movimentos sociais, operadores públicos do serviço de água e esgotamento sanitário, organizações da sociedade civil, acadêmicos, e outros setores na Espanha e em outros países europeus enfatiza os critérios comuns a todos os Direitos Humanos, como a participação, acesso à informação, transparência e a prestação de contas para transcender a neutralidade do texto da Resolução, em relação aos modelos de gestão dos serviços essenciais de água e esgotamento sanitário e associa a defesa dos DHAS com a defesa da gestão pública desses serviços.

Estas duas contradições, de forma alguma, sintetizam a grande a variedade de debates surgidos em torno dos DHAS. Obviamente, são apenas dois exemplos que consideramos relevantes para destacarmos nesta breve Declaração. Possivelmente, o ponto forte da resolução 64/292 aprovada pela Assembleia Geral das Nações Unidas (AGNU) em 28 de julho de 2010 é a “(reafirmação) da responsabilidade dos Estados em promover e proteger todos os direitos humanos, que são universais, indivisíveis, interdependentes e estão relacionados entre si e que devem ser tratados de forma global e de maneira justa e equitativa e em pé de igualdade e receber a mesma atenção”, incluindo o agora reconhecido “direito a dispor de água potável e saneamento em condições equitativas”. Sem dúvida, os terríveis impactos da pandemia COVID-19, desatada desde o início de 2020, contribui para expor toda a crueldade das realidades que imperam nos diversos territórios, incluindo a responsabilidade dos Estados na expansão de projetos políticos genocidas, como o que se desenvolve neste momento no Brasil, um projeto sancionado por eleições formalmente democráticas. Mas, não muito diferente dos projetos em implementação em muitos outros países, onde a defesa da vida humana foi abertamente subordinada aos interesses das minorias no poder e das grandes empresas transnacionais. A falta de vozes suficientes entre as elites intelectuais e políticas, vozes que sejam suficientemente críticas para denunciar o estado da implementação do DHAS e contribuir na sua reformulação – entre outras questões vitais – é uma manifestação do profundo grau de deterioração dos processos de democratização substantiva da política e a gestão da água e de nossas sociedades em geral. Sem dúvida, se analisarmos profundamente as múltiplas controvérsias ainda não resolvidas que caracterizam o DHAS é possível ver as razões que explicam porque tantos Estados rechaçaram durante décadas o reconhecimento do DHAS, porque muitos dos Estados mais poderosos do planeta se ausentaram da votação em 28 de julho de 2010 e porque o DHAS, em nível global, continua sendo uma utopia para centenas de milhões de pessoas.

Com base nas considerações prévias,
. Celebramos, em seu décimo aniversário, a aprovação da Resolução 64/242 da Assembleia Geral das
Nações Unidas, em 28 de julho de 2010, que “Reconhece que o direito à água potável e ao saneamento é um direito essencial ao pleno desfrute da vida e de todos os direitos humanos”;

. Reconhecemos que a aprovação de dita Resolução foi resultado de décadas de esforço por parte de pessoas, instituições, movimentos sociais, entre outros atores comprometidos com projetos  universalistas, democráticos, com concepções diversas, mas, convergentes da espécie humana, fundados nos princípios da igualdade, da solidariedade, da inclusão e da defesa da vida;

. Entendemos que o princípio de que o acesso a água e ao saneamento seja reconhecido como um Direito Humano não é aceito de forma unânime pelos Estados nacionais e outros atores que detém o poder político, econômico e financeiro a nível global. Durante décadas muitos Estados nacionais recusaram apoiar o reconhecimento do DHAS, com distintos argumentos. Apesar de que na última década a maioria dos Estados nacionais que se opunham ao reconhecimento do DHAS mudaram a sua posição, a evidência demonstra que para muitos Estados – incluindo os que inicialmente apoiaram a Resolução 64/292 – trata-se de um mero reconhecimento formal. Esta desvalorização do DHAS a sua dimensão meramente formal caracteriza também muitas das práticas concretas das instituições
internacionais de desenvolvimento e financiamento assim como das empresas transnacionais que operam no setor de água, muitas das quais retoricamente dizem respeitar o DHAS;

. Participamos ativamente – desde nossas atividades docentes, de pesquisa, de intervenção prática, de gestão em organismos públicos e comunitários, sindicatos, movimentos sociais, organizações da sociedade civil, entre outros – no estudo e debate, sobre as diversas controvérsias e profundas contradições que caracterizam a definição do DHAS incorporada na Resolução 64/292 e textos subsequentes. Fazemos parte, consequentemente, das iniciativas de diferentes setores acadêmicos, políticos, sindicais, sociais etc. que trabalham na redefinição do DHAS e especialmente na luta política e social pela implementação concreta de políticas e ações que definitivamente contribuam à eliminação da desigualdade e a injustiça na Política e gestão da água e dos serviços essenciais de água e esgotamento sanitário, higiene e saúde pública e ambiental;

. Demandamos que a definição oficial do DHAS seja submetida a uma revisão crítica fruto de ampla participação, includente e democrática; que reconheça a demanda dos diversos atores historicamente estabelecidos nos territórios e a necessidade do cuidado das fontes de água; que dê conta das controvérsias e contradições existentes e que adote posições claras que não deixem margem para dúvidas sobre os temas cruciais. Deve-se abandonar a linguagem vaga e evasiva da diplomacia internacional e as ambiguidades, que no melhor dos casos, refletem a falta de compromisso e a renúncia em adotar posições inequívocas – mas, que frequentemente explicitam a existência de
interesses que não possuem relação com o compromisso universalista e democrático com a defesa da vida no planeta e com o futuro da espécie humana. Destaca-se, devido a extrema urgência, a necessidade de revisar o texto do DHAS para que este tenha maior clareza, transparência e compromisso inequívoco em declarar a completa INCOMPATIBILIDADE dos DHAS com:

● as políticas neoliberais, em suas múltiplas versões – como a privatização, mercantilização etc. – das fontes de água e dos serviços essenciais de água e esgotamento sanitário, incluindo, a expansão massiva de água engarrafada. A atual expansão de modelos de política pública que transferem o controle direto e indireto das fontes de água e das entidades e empresas públicas de água e esgotamento sanitário à grandes empresas multinacionais e investidores privados deve ser declarado incompatível com o DHAS;

● as políticas neoimperiais e neocoloniais de controle e apropriação das fontes de água e dos serviços públicos essenciais por parte de Estados nacionais e empresas transnacionais, que continuam saqueando os povos originários, as comunidades rurais e de forma crescente a cada vez setores mais amplos de seus territórios e recursos. Esses processos incluem a expansão da mineração em grande escala, do agronegócio, das grandes obras de infraestrutura hídrica, entre outros, que são também responsáveis pela extrema violência na forma de massacre e diversas formas de violação dos direitos humanos de quem defende seus territórios e águas;

● formas excludentes de política e gestão de água e dos serviços públicos essenciais, que negam a diversidade de princípios, valores e interesses materiais desenvolvidos historicamente por diferentes culturas com relação à água como bem comum que é a base da vida no planeta, como por exemplo, a redução da água a sua função de recurso produtivo ao serviço de acumulação privada de lucro.

E que o reconhecimento inequívoco da implementação do DHAS requer:
● o abandono imediato, por parte dos Estados nacionais e das instituições internacionais de desenvolvimento e financiamento do seu apoio explícito e implícito aos processos de privatização, mercantilização etc. das fontes de água e dos serviços essenciais de água e
esgotamento sanitário;

● que a informação sobre o estado das fontes de água, incluindo detalhes sobre sua qualidade e quantidade, seus níveis de contaminação etc. e sobre os sistemas de tratamento, armazenamento, distribuição, reutilização etc. esteja disponível regularmente ao público sem restrições, de forma completa e atualizada.

● que o controle e a gestão das fontes de água e dos serviços essenciais de água e esgotamento sanitário devem estar em mão de entidades públicas, em sentido amplo, que inclua as comunidades locais de forma efetiva, sujeitas ao controle democrático da cidadania, dos
usuários e das comunidades;

● o fortalecimento das empresas públicas e comunitárias de serviços essenciais de água e esgotamento sanitário para que possam efetivamente cumprir suas funções, incluindo a provisão de apoio técnico e financeiro adequado;

● o compromisso explícito e inequívoco das elites intelectuais e políticas progressistas com este processo – uma vez que o silêncio esmagador, registrado em muitos países que enfrentam uma rápida degradação de seus processos de democratização substantiva, equivale a cumplicidade com as forças sociais e políticas responsáveis por tal degradação, dada a magnitude do desafio enfrentado e o tremendo impacto desses processos em grandes setores da população.

Rede WATERLAT-GOBACIT, 23 de julho de 2020

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