Artigo do historiador e pesquisador carioca, Marcelo Sant’ Ana Lemos, publicado originalmente no Jornal Abaixo Assinado, em Out/2021.
A maioria dos cariocas, até os que frequentam o Recreio dos Bandeirantes, a Prainha, Grumari e o Pontal de Sernambetiba não conhecem essa beleza natural geológica, arqueológica e paisagística que desponta no final da praia do Recreio, rivalizando com o Pontal de Sernambetiba, pela beleza cênica.
A sua ocupação remonta do tempo dos povos que construíam sambaquis (nome que vem do tupi tambá – conchas e ki – amontoado), que são montes artificiais, de alguns metros de altura, constituídos principalmente de restos de conchas, mas também de ossos da fauna local e onde faziam enterramentos de pessoas.
Em pesquisas arqueológicas feitas na década de 1960, do século passado, o arqueólogo Carlos Manes Bandeira descobriu ao redor e numa gruta no Morro do Rangel quatro sítios arqueológicos ocupados ou pelo povo construtor de sambaquis ou pelos Tamoios, este bem na base do Morro do Rangel.
O que demonstrava o interesse dos povos originários por essa região onde combinavam-se os ambientes de floresta, de restinga e marinho, tendo recursos alimentares abundantes. O Morro do Rangel tem mais de nove grutas e abrigos sobre rochas, sendo os mais conhecidos a gruta do camping, a Toca Santa e a Gruta da Fundição. Nesta última Manes Bandeira encontrou além de restos de fogueiras e conchas, um material lítico (feito de rocha) que servia base para os indígenas quebrarem coquinhos, um alisador que poderia ser usado para modelar cerâmica, demonstrando a ocupação humana daquela gruta.
A Toca Santa, também explorada na mesma época, era a maior caverna da região e sobre ela existiam lendas locais contadas pelos antigos moradores: ali existi riam cobras gigantes, que habitavam suas profundezas, ou então eles encontrariam um portal místico que levaria para locais onde existi riam tesouros ainda não descobertos, mas cercados de perigos como areias movediças no centro da Toca, como jurava o morador de nome Manoel aos expedicionários daquela época.
Tocas, grutas e lendas à parte, o Morro do Rangel também tem uma diversidade de plantas e fl ores, que hoje até se encontra um pouco empobrecida pelo desmatamento, mas que ainda guarda nas suas encostas espécies endêmicas e com risco de extinção. Além disso na sua base funciona há dezenas de anos um camping e no topo desse monumento geológico, de 164 metros de altura, existe uma rampa para prática de saltos de asa delta, de onde se deslumbra a belíssima paisagem do Recreio e a Barra da Tijuca.
Para defender a preservação do Morro do Rangel, em seus aspectos arqueológico, cultural, turístico e ecológico, que vem sendo ameaçado pelo uso desordenado, diversos grupos de moradores organizados em torno de várias entidades como: Associação de Voo Livre do Recreio, Associação de Surf Recreio 8W, Espeleogrupo Rio de Janeiro (EspeleoRio) e Onda Carioca encaminharam para a Prefeitura do Rio de Janeiro, em junho deste ano, a proposta de transformar o Morro do Rangel, que já é um bem arqueológico, etnográfico e paisagístico tombado, desde 1972, em uma Unidade de Conservação (UC) com gestão comunitária, uma proposta inédita dentro Sistema Nacional de Unidades de Conservação e do Plano Nacional de Áreas Protegidas.
Assim a cidade ganharia o Parque Comunitário Morro do Rangel, de gestão comunitária e que preservaria a biodiversidade local, incentivaria o turismo ambiental com apoio de guias locais, incentivaria a educação ambiental nas escolas do entorno, manteria a prática de voo livre e geraria oportunidades de emprego e renda para os moradores da região. Desejamos e apoiamos essa proposta de transformar o Morro do Rangel num Parque Comunitário! Que a Prefeitura e a Câmara dos Vereadores atendam a solicitação dos moradores do Recreio!
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