Artigo de Sérgio Ricardo de Lima, Cofundador do Movimento Baía Viva, membro do Conselho Estadual dos Direitos Indígenas (CEDIND-RJ) e mestrando do Programa de Pós-Graduação em Práticas em Desenvolvimento Sustentável (PPGPDS) da Universidade Federal Rural do Rio de Janeiro (UFRRJ)

 

O Movimento Baía Viva luta em defesa do meio ambiente há mais de 20 anos na defesa e salvaguarda do patrimônio ambiental, da biodiversidade marinha e dos usos sustentáveis nas baías fluminenses (Guanabara, Sepetiba e da Ilha Grande) e pelo reconhecimento dos direitos dos povos e comunidades tradicionais que são legalmente protegidos pela CF 1988 e a Convenção 169 da Organização Internacional do Trabalho (OIT). No final dos anos 1980, durante o processo Constituinte, foi de nossa autoria a Emenda Popular que assegurou às baías fluminenses e ao estratégico rio Paraíba do Sul, no Capítulo do Meio Ambiente da Constituição do Estado do Rio de Janeiro (1988), o status de proteção legal como Áreas de Preservação Permanente (APP) e como Áreas de Relevante Interesse Ecológico (ARIE). Durante todo este tempo nunca vivenciamos um fato tão escandaloso.

O INEA-RJ, e a Secretaria Estadual de Meio Ambiente (SEAS), exigiram, em 2016, a assinatura de um TAC-Termo de Ajustamento de Conduta com a TRANSPETRO/PETROBRAS, devido ao sério acidente com derramamento de petróleo no TEBIG em 2015 num volume de aproximadamente 852 litros de óleo dentro de áreas protegidas com a mancha de óleo atingindo 450 km2 do mar de Angra dos Rei. O acidente ocorreu na operação do navio-tanque Navion Gothenburg, que, para manter a estabilidade durante uma operação de transferência de petróleo cru para o navio-tanque Buena Suerte, realizava manobra interna de lastreamento.

Segundo dados do diagnóstico de vazamento de óleo elaborado pelo Estado do Rio de Janeiro, pela Secretaria de Estado do Ambiente (SEA) e pelo INEA, o óleo que foi dispersado no acidente de 10 de abril de 2015 atingiu uma área de 450 km² na Baía da Ilha Grande e na Baía de Sepetiba, contaminando 4% do terreno da Área de Proteção Ambiental de Tamoios (APA Tamoios), administrada pelo INEA, e o óleo atingiu o espelho d’água afetando diretamente as comunidades planctônicas e nectônicas e a comunidade de botos-cinza (Sotalia guianensis), que faz parte da lista oficial de espécies em extinção, foi uma das mais prejudicadas. No TAC assinado, ficou proibida a prática de transferência de óleo entre embarcações (operações ship-to-ship) nas áreas situadas no interior das Baías de Sepetiba e da Ilha Grande.

O mais incrível é que o próprio INEA vem desrespeitando continuamente o TAC por ele determinado. Além de continuar permitindo as operações ship-to-ship no TEBIG, operado pela TRANSPETRO, que fica na Baía da Ilha Grande, o INEA aprovou uma averbação na LO (Licença de Operação) do Porto Sudeste, que fica na Baía de Sepetiba, para a ampliação de seu terminal para realizar operações ship-to-ship. Todas as licenças emitidas para o TEBIG e Porto Sudeste sem a devida exigência da apresentação de EIA-RIMA. Mais grave ainda que o INEA não é o órgão competente para emitir estas licenças, cuja competência é do IBAMA.

A Petrobras/Transpetro vem derramando petróleo com as operações SHIP-TO-SHIP na Baía de Ilha Grande. São mais de 20 milhões de barris/mês que não figuram na licença ambiental do TEBIG

Todo acidente com derramamento com Petróleo do Mar traz grandes danos ao meio ambiente. Se o acidente ocorrer em áreas marítimas dentro de baías, torna-se catastrófico. O dano é exponencialmente maior. Nas baías a renovação das águas é muito mais lenta, e abrigam os manguezais que são berçários da vida marinha. Derrame de petróleo em áreas de Baías Marinhas deve ser evitado!

Não tem nenhuma lógica ambiental que se traga petróleo, produzido a quilômetros de distância, para ser transferido de um navio para outro dentro das Baías de Sepetiba e da Ilha Grande. Não é possível que os produtores de Petróleo, em especial a PETROBRAS, não disponham de tecnologia e outros locais de menor risco para realizar estas operações fora de qualquer baía.

Enfim, com base nos princípios da Precaução e da Prevenção que são a base legal do Direito Ambiental nacional e internacional, o Movimento Baía Viva apresentou denúncia (REPRESENTAÇÃO) no dia 13 de setembro de 2021 sobre este fato aos Ministérios Públicos Federal e Estadual e esperamos que seus representantes cumpram seus papéis de fiscais da lei, exigindo a imediata suspensão das operações ship-to-ship nos interiores das Baías de Sepetiba e da Ilha Grande, exigindo que seja respeitado o TAC que foi definido pelo próprio INEA-RJ. Em 24 de setembro de 2021, outra Representação foi protocolada junto à Defensoria Pública da União (DPU), do 2º Núcleo Regional de Tutela Coletiva da Defensoria Pública do Rio de Janeiro (DPRJ), do Núcleo de Primeiro Atendimento Cível de Angra dos Reis e da Ouvidoria Geral da Defensoria Pública do RJ.

Tudo isso é fato real, pois temos em mãos cópia integral do TAC firmado em 2016, e as movimentações de petróleo no TEBIG podem ser facilmente apuradas nos registros do terminal.

Fazemos um apelo aos técnicos do INEA-RJ, que tem plena consciência dos danos e riscos destas operações de ship-to-ship no interior das Baías de Sepetiba e da Ilha Grande, que não aceitem as pressões políticas para darem pareceres contra a legislação, pois os políticos passam e vocês técnicos é que serão criminalmente responsabilizados por seus atos, nas pessoas físicas. Fica aqui a recomendação que atuem dentro dos preceitos legais e padrões éticos para evitarem problemas futuros em suas pessoas físicas, como em ilícitos tipificados na nas leis federais no. 9.605/1997 (Crimes Ambientais) e no. 8.429/1992 (Improbidade Administrativa) que trata das sanções aplicáveis aos agentes públicos por crimes contra a Administração Pública e na Lei Estadual no. 3467/2000 que “dispõe sobre as sanções administrativas derivadas de condutas lesivas ao meio ambiente no Estado do Rio de Janeiro”.

Preocupados com a extrema vulnerabilidade dos ecossistemas marinhos e costeiros do litoral fluminense, no início de 2020, o Movimento Baía Viva propôs à Assembleia Legislativa do Estado do Rio de Janeiro (ALERJ), o Projeto de Lei 1941/20 que tem por objetivo proibir as inseguras operações “SHIP TO SHIP” no interior das baías de Guanabara, Sepetiba e da Ilha Grande. Há meses, a tramitação deste PL encontra-se engavetado na ALERJ por pressão (lobby) das grandes petroleiras sobre parlamentares de diversos partidos. Diante desse cenário, o Movimento Baía Viva lançou a Campanha “DESENGAVETA, ALERJ!”, pela aprovação do PL 1941/2020, que busca salvaguardar as três baías fluminenses do desastre por transbordo de óleo entre navios petroleiros!

Como parte desta mobilização, em 7 de outubro de 2020 o Baia Viva e a Coalizão PACTO PELO MAR – Municípios Fluminenses, formada por cerca de 100 organizações da sociedade civil, entidades de pesca, pesquisadores/as, enviaram ao presidente da ALERJ, o Deputado André Ceciliano, uma carta solicitando que o Projeto de lei 4191/2020 seja colocado em votação. Segue o teor da carta de 07/10/2021: https://baiaviva.org.br/carta-cobrando-a-votacao-do-pl-1941-2020/

Fazemos um apelo à mídia em geral e a todos/as aqueles que reconhecem a importância do potencial turístico e da biodiversidade marinha das nossas ameaçadas baías fluminenses para que como parte do compromisso ético que todos nós – sociedade, academia, órgãos públicos, setor empresarial – devemos ter e assumir durante a Década do Oceano e da Década da Restauração dos Ecossistemas (ONU, 2021-2030), que se juntem ao Movimento Baía Viva em defesa das Baías de Sepetiba e da Ilha Grande enquanto ainda é tempo.

Talvez ainda nos falte a consciência coletiva de que temos um único Oceano

E quando, em função da manutenção e da expansão ilimitada e infinita de um insustentável e poluidor modelo de desenvolvimento dependente do petróleo, provocamos o ‘sacrifício ambiental’ das belas e biodiversas baías do Estado do Rio de Janeiro (Guanabara, Sepetiba e da Ilha Grande). Na prática ajudamos a comprometer de forma irrecuperável parte da saúde ambiental dos ecossistemas e promover mais agravos à saúde humana. Nem mesmo os, cada vez mais presentes, efeitos negativos dos eventos climáticos extremos, têm sido considerados nesta voraz ganância por mais acumulação privada de capitais, renda e riquezas às custas da formação de novos passivos socioambientais que promovem feridas e crateras na Natureza que nos dá a todos água, ar puro, terra saudável, alimentos, sol e vida.

Link da Campanha “DESENGAVETA, ALERJ!”, clique aqui