Por: Sérgio Ricardo Potiguara
A mercantilização da Natureza aprofunda a crise civilizatória e nos países em desenvolvimento e periféricos é uma herança do Colonialismo.
Cada vez mais, temos visto grandes corporações transnacionais, inclusive com financiamento do governo federal via o BNDES, investirem pesado no super lucrativo “mercado de carbono” oriundo da mega biodiversidade brasileira: no entanto, como fica a chamada “repartição justa e equitativa dos benefícios” em favor dos Povos e Comunidades Tradicionais que é um direito internacional amplamente previsto e reconhecido tanto no Protocolo de Nagoya, como na Convenção da Diversidade Biológica (CDB) e na Lei Federal de proteção à biodiversidade!?
Num mundo contemporâneo capitalista que caminha para uma Emergência Climática global, apesar da moderna retórica esverdeada de governos e do setor empresarial como os que tem sido feitos nos foros internacionais e em sucessivas conferências climáticas da Organização das Nações Unidas (ONU), o que temos visto é que o Brasil vivencia um repaginado ciclo de Neoextrativismo, alavancado pelo crescimento acelerado da produção do PIB pelo agronegócio que, ainda hoje, lucra destruindo e envenenando o bioma Cerrado que neste momento arde em chamas pelas queimadas, desmatamento para o plantio de soja e de outras commodities e monoculturas e pelo uso indiscriminado de agrotóxicos.
Aliás, foi exatamente este mesmo padrão equivocado de economia cinza que destruiu, nas últimas décadas, grande parte da Amazônia e, no passado, a partir da Colonização européia, a outrora exuberante Mata Atlântica que se estendia pelo litoral entre os estados do Rio Grande do Norte e do Rio Grande do Sul.
Em pleno século 21, na prática, as elites econômicas e políticas do país, em sucessivos governos de diferentes matizes político-ideológicas, tem reproduzido antigas práticas coloniais típicas de um desenvolvimentismo predatório e poluidor que concentra renda e riquezas, destrói o patrimônio ambiental, contamina as águas e a saúde humana e ameaça extinguir a nossa rica sociobiodiversidade e agrobiodiversidade.
O resultado deste perverso processo secular de rapinagem dos bens da Natureza e de exploração predatória, é a manutenção das comunidades tradicionais na exclusão social e econômica e o acirramento de conflitos territoriais e fundiários no país, que tendem a se multiplicar Brasil a fora em especial com a recente aprovação do famigerado e inconstitucional “Marco Temporal” pelo Congresso Nacional que representa um retrocesso civilizatório.
Isso chama-se Biopirataria e Racismo Ambiental estrutural disfarçados de “economia verde”.
O saudoso líder seringueiro Chico Mendes, brutalmente assassinado em 1988 por madeireiros, à época já nos alertava sobre a importância da ‘economia da floresta em pé’ que busca valorizar a importância dos Povos e Comunidades Tradicionais como guardiões da conservação ambiental dos territórios.
Em dezembro de 2023, a Câmara dos Deputados aprovou uma Lei que visa normatizar as transações comerciais entorno dos créditos de carbono, que entre os seus vários desafios está o de criar mecanismos democráticos e transparentes que venham a garantir de forma efetiva o direito de acesso aos benefícios financeiros a serem gerados por parte das populações que historicamente protegem as florestas, os mananciais e ecossistemas.
Contraditoriamente, enquanto isso, ainda seguimos queimando e desmatando de forma acelerada os nossos biomas; liberando a exploração de petróleo com alto risco de desastres ambientais na foz do Rio Amazônas enquanto as autoridades e petroleiras fazem discursos inflamados na Conferência do Clima (COP 28) em defesa de uma suposta transição energética; continuamos como recordistas mundiais no uso de venenos químicos pela agricultura industrial, sendo que muitos destes agrotóxicos já são proibidos em outros países; e sem valorizar de forma adequada o trabalho valoroso dos servidores públicos do IBAMA e do ICMBio.
A construção de uma sociedade do Bem Viver mais justa e igualitária, requer uma mudança profunda na rota hegemônica da economia, assim como uma inversão nas prioridades de investimentos no campo das políticas públicas.
Sérgio Ricardo Potiguara
Diretor do Movimento Baía Viva, membro do Conselho Estadual dos Direitos Indígenas (CEDIND-RJ). Mestre em Ciências Ambientais pelo PPGPDS do Instituto de Florestas da UFRRJ.
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