VOLTA REDONDA (RJ) – Um crime ambiental que se arrasta há décadas chegou ao Ministério Público Federal (MPF). A Companhia Siderúrgica Nacional (CSN) foi denunciada pelo órgão devido aos danos causados pelo depósito inadequado de escórias de aciaria, um resíduo industrial que forma uma verdadeira montanha na área da siderúrgica. O problema, longe de ser uma questão pontual, é histórico e tem sido sistematicamente denunciado por movimentos socioambientais, com destaque para o Baía Viva, que há anos pressiona por uma solução definitiva.
A Cronologia de um Passivo Ambiental
A linha do tempo do problema, construída a partir das denúncias do Baía Viva e da ação do MPF, mostra um conflito que se intensificou nos últimos anos:
Privatização e a Herança Maldita (Décadas de 1990 em diante): Conforme destacado pelo Baía Viva, o processo de privatização da CSN, concluído em 2009, não incluiu a responsabilidade pela destinação final de passivos ambientais graves, como as montanhas de escória. O movimento argumenta que a venda da empresa “não dá conta de resolver poluentes graves” que foram se acumulando ao longo de mais de 80 anos.
Pressão Social e Envolvimento do MPF (2023): Em agosto de 2023, o Baía Viva levou a questão diretamente ao MPF. Em uma reunião com a Procuradoria da República em Volta Redonda, o movimento apresentou estudos e alertou sobre os riscos da montanha de escória, que continua a crescer. O objetivo era pressionar por uma investigação e por medidas concretas.
A Denúncia Formal (Outubro de 2025): O caso culminou com a denúncia do MPF em 7 de outubro de 2025. A ação judicial detalha que a CSN despeja as escórias, classificadas como resíduos perigosos, de forma irregular há mais de 30 anos, contaminando o solo e os recursos hídricos da região. A empresa e dois de seus executivos são acusados de crime ambiental.
A Posição do Movimento Baía Viva
O Baía Viva tem sido uma voz crítica e constante nesse processo, e suas opiniões delineiam as falhas percebidas no sistema.
Falácia da Privatização como Solução: O movimento é enfático ao afirmar que a privatização da CSN não resolveu, e talvez tenha agravado, a questão ambiental. Eles sustentam que o modelo de gestão focado no lucro dos acionistas negligencia os investimentos necessários para remediar danos ambientais de longo prazo, tratando o meio ambiente como uma “externalidade”.
Alertas Ignorados e Riscos Concretos: Durante a reunião com o MPF em 2023, o Baía Viva já alertava para os perigos da instabilidade geotécnica da “montanha” de resíduos, que representa um risco para os trabalhadores e comunidades do entorno. Além disso, destacaram a contaminação por metais pesados, que pode atingir o Rio Paraíba do Sul, vital para o abastecimento de água de milhões de pessoas no estado do Rio.
Cobrança por Responsabilidade: A linha de atuação do movimento não é apenas de denúncia, mas de cobrança por uma solução integrada. Eles exigem que a CSN seja responsabilizada judicial e financeiramente pela recuperação da área degradada, indo além de meras multas administrativas, que consideram insuficientes.
Procurada, a CSN não se manifestou publicamente sobre a denúncia do MPF até o momento. O caso, que agora segue na Justiça Federal, coloca em xeque o legado ambiental de uma das maiores siderúrgicas do país e testa a capacidade do poder público e da justiça em frear danos que, segundo as acusações, são cometidos há gerações.
“Meio Ambiente Virou Brincadeira”: Nomeação de Jovem de 18 anos Gera Revolta
Enquanto o MPF aciona a Justiça para combater um crime ambiental histórico, uma nomeação no âmbito do governo do estado do Rio de Janeiro acendeu um novo alerta entre ambientalistas e servidores públicos. A subsecretaria de Transição Ecológica e Desenvolvimento Sustentável, unidade administrativa vinculada à Secretaria de Estado de Desenvolvimento Econômico, será comandada por uma jovem de 18 anos, filha do deputado estadual Célia Jordão (PL), aliada do governo.
A nomeação, publicada no Diário Oficial, foi recebida com críticas severas e um tom de revolta por parte de entidades e especialistas da área, que veem o ato como uma clara desvalorização das políticas ambientais e um caso de nepotismo.
Falas de Revolta e Indignação
A reação foi imediata e contundente. O jornal Ultima Hora Online trouxe declarações que espelham a indignação do setor.
Sérgio Cypriano, presidente da Associação dos Servidores de Meio Ambiente (Assema-RJ): “Isso é um deboche com a categoria e com a sociedade. Colocar uma menina de 18 anos, sem qualquer experiência ou formação, para comandar uma subsecretaria que trata de temas complexos como licenciamento e transição ecológica é de uma irresponsabilidade sem tamanho. O meio ambiente virou brincadeira de criança nas mãos desse governo.”
Márcia Soares, ex-subsecretária de Meio Ambiente: “É um desrespeito a todos os técnicos concursados, mestres e doutores que dedicaram suas vidas à área. Enquanto lutamos para resolver problemas sérios como o da CSN, que exigem conhecimento técnico profundo, o governo nomeia uma crianca neófita. Isso envia a mensagem de que a pasta não é levada a sério.”
A nomeação é vista como uma manobra política para agradar a base aliada do governo, tratando uma pasta técnica como moeda de troca. Ambientistas argumentam que a gestão de questões como a contaminação em Volta Redonda, os resíduos sólidos e a proteção de unidades de conservação exige expertise e isenção política, atributos que consideram inexistentes na nova gestora.
Cenário de Crise e Descaso
A situação cria um cenário paradoxal: de um lado, o Ministério Público Federal move uma ação robusta para responsabilizar uma empresa por décadas de poluição, um processo que exigirá acompanhamento técnico minucioso do estado. De outro, o próprio governo estadual, que deveria ser um ator central na fiscalização e na solução desses problemas, toma uma decisão que, para críticos, banaliza e politiza a gestão ambiental.
A revolta gerada pela nomeação da jovem de 18 anos não é um fato isolado. Ela se soma ao histórico de denúncias sobre a CSN e pinta um quadro preocupante de desmonte e descaso com a agenda socioambiental no estado, levantando dúvidas sobre a real capacidade institucional de enfrentar crises ambientais presentes e futuras. Enquanto isso, a montanha de escória em Volta Redonda permanece, um símbolo duradouro de um problema que exige seriedade técnica e compromisso público de longo prazo.

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